Hoje acordei
cedo. Aceito as risadas afinal você sabe mais que ninguém que odeio as manhãs,
principalmente aquele cheiro que me invade as narinas, cheiro de partículas de
noite que ainda perduram teimosas em meio aos raios de sol que as dissolve
devagar como uma folha seca que é consumida pela terra molhada. Abri a janela,
e diferente dos outros dias eu gostei, gostei das cores que rasgavam o céu que
parecia novo, caminhei pela casa pisando devagar no chão, talvez algo
involuntária, ou talvez fosse um hábito, uma rotina. Vi as roupas jogadas no canto
do quarto que teimava em conservar a escuridão de horas atrás, pensei em
arruma-las, mas passei direto em direção a estreita porta entreaberta, e por
alguns instantes me olhei cuidadosamente no espelho redondo do banheiro
pequeno, vi a barba por fazer e sorri sozinho, sei que você não gosta quando a
deixo assim, nunca me deu um argumento concreto pelo desgosto, só diz que não
gosta e tá dito e faz aquela cara meio autoritária que faz ferver meu sangue,
mas logo em seguida me presenteia com um sorriso que força o aparecimento das
covinhas nas bochechas, gosto delas são tão tuas. Lavei o rosto, mas como uma
forma de pirraça, como você costuma dizer ,deixei que a barba lá se mantivesse,
voltei ao quarto e coloquei um pouco de musica, na verdade a nossa musica, ela
faz com que teus olhos mudem de alguma forma que ainda não consegui entender, e
talvez nem queira entender alguns dos teus mistérios me encantam. Voltei às
roupas largadas no canto, enquanto organizava senti nelas o teu perfume, e foi
como se sentisse a tua presença, fechei os olhos e as lembranças não tão
distantes me invadiram sem pedir permissão, afoitas e mimadas, me arrancaram
mais algumas daquelas risadas bobas que esboçamos quando revivemos um anterior
que perdura, abracei aqueles pedações de tecido que encobrem a vergonha que nós
humanos exercemos sobre nossos corpos, estava à procura do teu toque, queria
sentir tua pele, afagar os teus cabelos, sentir os teus sabores. Voltei à cama
com as roupas nos braços, deitei e abracei como costumo fazer quando dormimos
juntos, gosto de velar teu sono, parece tão frágil quando adormece, o cabelo
faz um envolvimento negro esparramado sobre o travesseiro, gosto do contraste
deles com a pele suave do rosto. Comecei a sentir aquele aperto no peito, e
aquela vontade de sair correndo ao teu encontro sem me importar com os porens,
as amarras, as grades invisíveis da vida. Lembrei-me de algumas de suas
palavras, palavras insanas, aquelas que diziam que você cuidaria de mim mesmo
que não precisasse ou que eu quisesse, me senti acolhido mesmo sustentando meu
orgulho ao qual gritava que não precisava de proteção que já sabia viver.
Tive medo de me perder, de deixar os
meus dogmas, algumas das minhas convicções, tirei pedaços de mim por você,
ainda não sei se fiz certo, não quero pensar sobre isso, quero saber do agora,
só isso, o futuro que venha depois. Me senti bem depois, porque sei que o corpo
presencial está longe, mas parte do teu espirito habita em mim.
Pensamentos de Rafa
"Renda-se, como eu me rendi. Mergulhe no que você não conhece como eu mergulhei. Não se preocupe em entender, viver ultrapassa qualquer entendimento" (Clarice Lispector)
quinta-feira, 23 de agosto de 2012
sábado, 3 de março de 2012
Tópicos Tortos
Veio àquela vontade louca, sem nexo de falar algo. Aquela velha vontade de brincar com o mundo, mesmo sabendo que você é a criança
sem dedos. Algo ainda precisa ser dito... Então vem uma avalanche de palavras e
frases: Nasça,cresça, descubra, se decepcione, abrace, empurre, corra, pare,
respire, sufoque, chore, ria, reflita, compartilhe, repare, ultrapasse, fique
pra traz, ganhe, perca, trapassei com honestidade, Ame, Odeie, esmague,
construa, destrua, lamente, sonhe, sinta o gosto, vomite, cheire, sinta o sol,
carregue, deixe cair, transcreva, apague, crie, reinvente, emudeça, fale pelos
cotovelos, limpe as vidraças, atire pedras, abrace, arranhe, faça sexo, dê,
coma, lamba, soletre, cantarole, dance, caia de bêbado, cague, durma,
desmascare, zombe, rasteje, voe, grite, sussurre, cante e encante, corte,
cicatrize-se, minta com consciência, fale a verdade, desmaie, sinta vergonha,
conheça, mande embora, lustre as máscaras, queime-as, peça perdão, não perdoe,
tenha Medo, arrependa-se, dilacere o mundo com os dentes, olho por olho dente
por dente, ganhe, brilhe, ofusque, vista, fique nu, pinte o cabelo, depois
a alma, bata, morda, beije, masturbe-se, denuncie, mate, faça uma vida, nunca
tenha um filho, fique doente, recomponha-se, acenda, apague, desmistifique,
seja sombrio, soluce, não seja você, seja apenas você, escorregue, levante,
revolucione, apodreça, e recomece outra vez.
sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012
Brilho Fosco
Falar em medo pode ser um pouco aterrador para mim, por isso prefiro usar a palavra receio, que não deixa de ser uma espécie de medo amenizado; então digo que tinha certo receio de me deixar ser absorvido pelo mundo, sofria por não permitir que o mesmo me tocasse, no entanto continuo padecendo por ter percebido que o tal sorriso era o brilho falso de um caco de vidro velho. Alguma coisa me alertava sutil, dizia que se eu me deixasse ver eu me habituaria a ele e por consequência acabaria descobrindo a sua não tão bela forma, e por mais uma forma torta de defesa acabaria por me afastar. E agora o que me resta agora? Nada mais que o questionamento: conviver com o cheiro podre da carcaça ou enterra-la de uma vez. Possivelmente eu consiga me acostumar com seu odor ou talvez deva deixa-la, deixar que ela própria se decomponha, isso um dia acontecerá? Quem sabe esteja sendo um pouco otimista. Abandonei-me, me guardei e esqueci onde. Voltar? Ou abraçar novamente a velha conhecida, amiga-inimiga, companheira solidão? Eu gosto às vezes do que ela me ensina, me ensina sobre mim como uma psicóloga abstrata diz quem sou e porque eu sou o que é bom pra mim, o ruim é que nem sempre me sinto bem com o que ouço. Talvez não consiga ou não deva abraçar o mundo com as pernas, e se não puder? O que então significa viver? Respirar, acordar, dormir, mijar e cagar? Será que é essa a definição de viver? De que me serve ser a mais bela obra de arte se não existe ninguém que possa decifrar-me? De que me serve ser aquela música se estão todos surdos?
segunda-feira, 9 de janeiro de 2012
Garoto dos Sonhos
Olhas-me com essa sensualidade banhada em ternura
Beija-me com teus lábios, os quais roubam meu calor
Acalma-me com teu sorriso, e me eleva com teus sonhos
Abraça-me e sinto teu coração em sintonia com o meu
Sinto tua falta enquanto me deito, queria tua carne com a minha
Meus ouvidos choram por não sentirem a tua respiração
Descansa em minhas asas e me diz novamente que sou teu anjo
Envolva minha alma com tua doçura, dei-me um pouco dela
Ensina-me a sonhar garoto dos sonhos...
Diga-me como andar sobre as nuvens, como ser um sonhador
Leva-me na tua liberdade, acaricia meus olhos com tua beleza
Não a beleza suja dos homens, mas a beleza mais rara, a da alma.
sábado, 3 de dezembro de 2011
Garoto do Balanço
E me sentia só, sempre com os mesmos movimentos
repetitivos.
O pequeno garotinho franzino sentado no balanço do jardim,
esperando a companhia de alguém que nunca veio.
E me sentia sem rosto, sempre imaginando uma vida fictícia
cheia de magia e esperança
E me sentia estranho, sempre falando sozinho enterrado em
minha própria cabeça
O pequeno garotinho que queria ter asas para voar o mais
alto que pudesse, queria ser especial.
E me sentia feio, sempre com a mesma expressão catastrófica.
E me sentia frio, sempre com a mesma saudade de uma vida
que nunca vivi.
O pequeno garotinho que viu o sangue sair dos pulsos até não
sentir mais aquela absurda dor que não tinha nome.
quinta-feira, 1 de dezembro de 2011
Vida Vadia
Andávamos os dois, sujos e fedendo a todos os tipos de
bebidas que se pode imaginar. Ela descalça com os sapatos vermelhos nas mãos,
os “red shoes” como ela mesma costuma dizer. Cambaleava, sobre a rua esburacada,
mal iluminada, e sorria sempre, quero dizer gargalhava freneticamente o que
deixava evidente os resquícios de pó que teimavam em resistir no seu belo nariz
afilado. Não entendia o porquê das gargalhadas e isso começou a me irritar. Ela
usava saia de escocês com um grande cinto com uma grande e brilhante caveira de
metal. O rosto sujo de maquiagem borrada, os cabelos desalinhados pintados de
vermelho, nos braços algumas manchas de corte, nos pulsos, na certa já fez o
velho ritual... A blusa rasgada deixava escapar o seio esquerdo, que se
projetava e pulava com os seus freqüentes tropeços. De repente me enfureci com aquela figura decrépita,
uma pobre vadia louca, senti vontade de estapeá-la, jogá-la ao chão, mas sabia
que não seria possível infelizmente eu já conheço a sua maldita força. Não a repúdio
essa é a tal da VIDA uma cadela de rua! Acho melhor me juntar a ela e como
dizia a sabia Hilda Hilst: a vida é liquida!
terça-feira, 22 de novembro de 2011
Doce Novembro
Embriagar-me-ei nos teus risos absurdos
Derramarei-me no teu corpo como balsamo perfumante
Mostrarei-te meus olhares de ave de rapina
Sim, consigo decifrar tua alma transparente
Beijar - ti- ei com o vigor escrachado de sempre
Inferirei-te minha adocicada peçonha
Amaldiçoarei os que te odeiam e abençoarei os que te amam
Expor-ti-ei o júbilo deslumbrante dos meus sonhos
E marcarei teu espírito com minha assinatura
Estarás sempre em mim, fazendo parte de mim
O tal, menino de olhos tristes e sorriso bem aventurado
O tal, Doce Novembro.
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